O Guaranazal da Nag Iracy

Data pubblicazione: Feb 24, 2018 1:21:13 PM

A Dona Iracy também se foi.

Desde a instituição formal da Livre Academia do Wara, depois do falecimento do Capitão Zezinho e do Tuxaua Adelino. a dela é a terceira cadeira que fica vazia entre os nossos "imortais": os guardiões da cultura saterè-mawè. Esta é uma lei natural: no renascimento da cultura mawé que estamos vivendo nesses anos, no tempo da procura dos Nag nia que ainda ficam espalhados e esquecidos nas cem aldeias da Terra Indígena Andirá-Marau sem ter participado do processo de institucionalização da LAW, a substituição não vai demorar...... mas o tempo e a historia não voltam, e cada um deles ou delas fica na verdade insubstituível. A figura da Dona Iracy, cavada pelo sol nas horas do trabalho no campo, ficará sendo para sempre o insubstituível ícone da Fortaleza do Waraná, mesmo sem ter ela nunca viajado para os encontros internacionais de Terra Madre. Pois foi exatamente na fábrica ao lado da casa da Mana Iracy, no tempo de auge do protagonismo da AMISM, foi por lá que se mudaram os moldes do Nusoken em que as mulheres sateré-mawé organizadas moldaram os novos fornos de barro e caraipé, distribuídos pela Terra Indígena toda, necessários para que o "guaraná dos índios" voltasse a ser Waraná, e para que com esses grãos lentamente torrados no ponto, o sapó voltasse a ser Wará. Fornos de tecnologia tradicional que foram também o primeiro presente com que começou a se construir a troca solidária com os produtores caboclos do baixo Andirá, para criar com eles uma faixa de proteção agroecológica em volta do Santuário ecológico e cultural do Waraná, em volta do guaraná nativo.

Mas para todos os que vinham de mais longe, dos quatro cantos do mundo para conhecer o Projeto Waraná, a Dona Iracy era a sentinela da Terra Indígena, na sua casa construída como uma alfandega de lado da pedra que marca a demarcação, parada obrigatória e paradeiro necessário para quem quisesse aprender como entrar com respeito na Terra Indígena e para quem quisesse assim, entrando respeitosamente, se sentir como na sua própria casa.

Chegando lá de Vintequilos, a aldeia de turismo comunitário, domínio do CGTSM fora da T.I. do outro lado do rio, eles já conheciam a maneira de cultivo tradicional e agroecológico, conforme aos protocolos, do verdadeiro Waraná, acreditando assim de ter entendido o que era. Porém, quando chegavam em Guaranatuba visitando o guaranazal dela, os esperava antes a decepção, e só depois (desde que eles quisessem mesmo) o verdadeiro entendimento. Com efeito era, na aparência, um guaranazal neglicenciado, não conforme ao protocolo, onde não se fazia consorciação. Mas como que se podia deixar desse jeito o guaranazal mais visitado e mais acessivel da Terra Indígena? Será que isso era um bom cartão de visita? Porque isso? Acontecia que os pés de Waraná falavam pra ela e se recusavam, não queriam porque não queriam. Ela os protegia do jeito que eles queriam ser, resistindo a qualquer argumento da equipe do Sistema de Controle Interno, e se passaram anos e anos antes de eles, através dos sentimentos dela, começarem a aceitar a ideia. Entendemos assim que eles, através dela, na forma aparente de um capricho de criança, procuravam nos lembrar uma verdade muito mais importante e profunda que não podemos nunca esquecer: o Wara-na, o inicio de todo conhecimento, não é letra morta, arqueologia de tempos que mudaram, mas algo vivo e presente, no espirito e na biologia, que existe e atua antes da sua interpretação cultural, por quanto que esta seja cuidadosa e certa. Um legado da Nag Iracy, para a Academia e para seu Povo.